3 chavões cristão que podem destruir a saúde mental dos jovens
Quando eu tinha cerca de 23 anos, uma pessoa bem-intencionada me disse que minha ansiedade, depressão e dor física estavam na minha cabeça. Segundo ela, se eu parasse de pensar neles e me concentrasse na Verdade de Deus, meus problemas desapareceriam.
Essa pessoa alegou ter vivido a mesma história que eu: eventos traumáticos durante a infância, abuso verbal intenso e diagnósticos incapacitantes que deixaram feridas profundas e sofrimento. Contudo, as doenças mentais e físicas que sentia acabaram sendo descartadas pelos meros chavões cristãos.
Na época, eu pensei que essa pessoa realmente sabia o que eu estava experimentando. No entanto, agora duvido que ela soubesse de verdade.
Essa experiência me fez perceber que existem três chavões ou suposições negativas e muitas vezes falsas, sobre o sofrimento dos jovens adultos, e que podem ser facilmente projetadas sobre nós.
Primeiro, há a suposição de que o sofrimento mental é algo que os jovens adultos devem ser capazes de superar sozinhos, como se fosse uma fase passageira ou uma simples questão de escolha pessoal.
Em segundo lugar, há a ideia de que a espiritualidade é a resposta universal para todos os problemas de saúde mental.
E, por fim, há a suposição de que, se uma pessoa é jovem e aparentemente saudável, ela não pode estar sofrendo de problemas de saúde mental.
Essas declarações foram feitas sobre mim e não ficaria surpreso se fossem ditas a você. E é por isso que quero que você seja capaz de identificá-las e repreendê-las.
O sofrimento mental é real e não deve ser subestimado e nem mesmo minimizado. Devemos nos esforçar para criar um ambiente onde as pessoas se sintam seguras para buscar ajuda e apoio sem julgamentos ou estigmas.
3 Chavões comuns que muitos cristãos falam e que podem destruir a saúde mental dos josvens
Neste estudo bíblico, vamos explorar algumas ideias ou chavões que são comuns dentro do contexto cristão e que podem ter um impacto negativo na saúde mental de jovens adultos.
Muitas vezes, essas ideias são transmitidas de forma bem-intencionada, mas podem ser extremamente prejudiciais.
Contudo, é importante examinar esses chavões e buscar uma compreensão mais ampla e saudável do que significa viver uma vida cristã plena e equilibrada.
1. “A ansiedade é falta de confiança em Deus”
Quando experimentei a ansiedade pela primeira vez aos dez anos, alguém que amo ameaçou me matar pelo telefone. Naquela época, ouvi um sermão que afirmava: “A ansiedade é uma falha em confiar em Deus”, uma ideia que se baseia em passagens bíblicas como Mateus 6:25-34, 1 Pedro 5:7 e Filipenses 4:6.
De acordo com esses versículos, Jesus nos aconselha a não nos preocuparmos. A palavra grega merimnaō/a, significa preocupação, traduzida como estar ansioso/cuidadoso com seus pensamentos ou preocupado com o cuidado. No entanto, existem três tipos de ansiedade: mundana, emoção humana e distúrbios clínicos.
Quando Jesus nos pede para não nos preocuparmos com comida, bebida, roupas ou segurança em Mateus 6, Ele está falando sobre coisas mundanas. Nós devemos confiar que Deus proverá, não ficar obcecados com ganhos terrenos. Se nos preocuparmos demais com coisas materiais ao invés do Reino, a ansiedade pode se tornar pecaminosa.
Apesar disso, o próprio Senhor Jesus experimentou ansiedade. Na noite em que Jesus foi traído,Ele suou gotas de sangue enquanto enfrentava a morte mais terrível da humanidade. Ele pediu fervorosamente a Deus para remover o cálice, se possível. No entanto, isso não significou uma desconfiança em Deus. Jesus conheceu a ansiedade como uma emoção e resposta humana, assim como a dor física e mental.
Jesus experimentou tudo o que nós, como humanos, experimentamos e ainda assim era imaculado. Ele conhece nossa dor e se preocupa. Portanto, não podemos dizer que suas ansiedades foram uma falha em confiar em Deus. Por que, então, diríamos o mesmo sobre nós mesmos e nossos irmãos e irmãs em Cristo em meio a seus sofrimentos?
Compreendendo o que é a ansiedade
A ansiedade é uma emoção humana e uma resposta aos estressores da vida. É normal e compreensível sentir ansiedade em situações estressantes, como bater o carro ou ir para a faculdade. No entanto, para aqueles que sofrem de transtornos mentais, como ansiedade generalizada (GAD) ou transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), a ansiedade pode ser muito mais grave e muitas vezes requer tratamento profissional.
A ansiedade não é uma questão de escolha, e sim uma questão de saúde. A qual necessita de tratamento médico, podendo levar algum tempo para ser tratada. Ferramentas como psicoterapia, recitação das Escrituras, oração, respiração profunda e sol podem ajudar, mas a cura é gradual e muitas vezes encontrada fora de nós mesmos.
Contudo, a ansiedade não é uma falha em confiar em Deus, mas uma parte normal da vida que podemos enfrentar com paciência e esperança.
2. “A depressão é um pecado”
O segundo chavão ou clichê cristão que me causou grande aflição foi a afirmação de que “Depressão é um pecado”. A depressão é um conjunto de condições relacionadas aos altos e baixos do humor de uma pessoa. De forma semelhante à ansiedade, pode ser dividida em dois tipos: emoção humana e transtornos clínicos.
Quando a depressão é uma emoção humana, é geralmente breve e/ou circunstancial. Por exemplo, se alguém perde um animal de estimação ou um ente querido, a tristeza que sente é comum. Acredito que Jó enfrentou esse tipo de depressão em seu livro. Ele passou de abençoado a amaldiçoado em um dia e tinha todas as razões para chorar. No entanto, após um período de sofrimento, Deus o abençoou e ele se alegrou.
Porém, a depressão clínica é uma emoção muito mais profunda do que o Monday Blues, pois é caracterizada por tristeza e apatia por pelo menos duas semanas. Esses sentimentos geralmente não desaparecem mesmo depois que o tempo ou as circunstâncias mudam. Dr. Mark Riley, cofundador e diretor executivo da SoulCare Counseling, observa que o Profeta Elias pode ter sido um exemplo de pessoa que sofria desse diagnóstico.
Elias enfrentou medo, fracasso, fadiga e futilidade e estava sobrecarregado e exausto. Ele pediu a Deus para tirar sua vida porque simplesmente não queria mais enfrentá-la. Talvez você já se sentiu assim? Essa depressão vai além de um sentimento, pois muitas vezes apresenta desespero, desesperança e até pensamentos suicidas. E embora isso possa parecer diferente de pessoa para pessoa, ainda é uma doença clínica.
O rei Davi, por exemplo, também pode ter sofrido de algum tipo de transtorno mental (Pub Med) devido aos seus lamentos nos Salmos. Em apenas algumas frases, ele louvava o Senhor por Sua bondade, mas também pedia para morrer.
Nesses exemplos, as pessoas não escolhem ter depressão, assim como não escolhem ter ansiedade. A depressão costuma ser um diagnóstico clínico e uma doença, não um pecado. E assim como a doença física, a doença mental precisa ser tratada, não repreendida.
Deus ilustra isso melhor em Sua resposta a cada um dos três cenários:
Quando Jó enfrentou toda aquela provação, ele permaneceu fiel a Deus em meio ao seu sofrimento. E embora outros possam ter dito a ele: “Você está pecando”, essa nunca foi a resposta de Deus. No final, ele foi mais abençoado do que no começo.
Elias enfrentou grande turbulência e perseguição em sua vida. Tantas pessoas o queriam morto que ele também desejava morrer. Mas quando Deus ouviu seus apelos, ele disse: “Descanse e coma, esta jornada é muito longa, ainda”. Ele está sempre pronto para suprir o que precisamos.
Davi experimentou uma ampla gama de emoções, mas era reconhecido como um homem segundo o coração de Deus. Ele sempre foi sincero e aberto com o Senhor, e apesar de enfrentar grande sofrimento, Deus o honrou por sua fidelidade.
Enquanto alguns cristãos acreditam que a “depressão é um pecado”, é importante lembrar que a depressão não é uma escolha ou uma fraqueza moral. É uma condição médica que afeta a saúde mental de uma pessoa, que deve ser tratada com a ajuda de profissionais qualificados.
Existem muitos recursos disponíveis para ajudar aqueles que lutam com a depressão, incluindo aconselhamento, terapia e medicamentos. Como cristãos, devemos estar dispostos a oferecer suporte e encorajamento aos que estão sofrendo, em vez de julgá-los ou envergonhá-los por sua condição.
O amor de Deus é incondicional e não depende do nosso estado emocional ou mental. Devemos seguir o exemplo de Jesus Cristo e oferecer compaixão e apoio aos que estão lutando com a depressão. Juntos, podemos superar esses chavões e o estigma em torno da saúde mental e ajudar aqueles que precisam a encontrar a cura e a esperança em Deus.
3. “Você só precisa orar e ler mais a Bíblia”
Embora a prática da vida espiritual, incluindo a oração e a leitura da Bíblia, seja essencial para o nosso bem-estar geral, não é suficiente para curar nossa saúde mental. Muitas vezes, as pessoas com problemas de saúde mental são erroneamente rotuladas como tendo falta de fé, porém isso não é verdade.
Embora a ansiedade e a depressão possam ter impactado minha jornada espiritual, elas não me afastaram de Deus, mas me aproximaram mais Dele. É em momentos de dor que me lembro das histórias bíblicas e olho para Jesus, que sofreu por mim. Como 1 Coríntios 12 afirma, Seu poder se fortalece em nossa fraqueza.
No entanto, o clichê de que as pessoas simplesmente precisam orar mais e ler a Bíblia é enganoso, pois muitas vezes é necessário buscar ajuda médica para doenças mentais. De fato, ignorar os recursos que Deus nos forneceu, como exercícios, famílias da igreja, médicos, remédios e aconselhamento, é perder a vida abundante que Ele deseja que vivamos.
Embora ler a Bíblia, orar e falar com amigos confiáveis sejam recursos espirituais valiosos, Deus também nos envia ajuda por meio de médicos, pesquisa científica e avanços na tecnologia de saúde. É importante lembrar que buscar ajuda médica não é falta de fé ou rejeição da provisão de Deus.
É crucial reconhecer e refutar chavões prejudiciais como esse para avançar em direção à cura.
Devemos confiar em Jesus e nas bênçãos que Ele colocou no mundo para nos ajudar a viver na verdade, integridade e bem-estar que Ele deseja para nós.
Conclusão
Em suma, é crucial que tenhamos cuidado ao usar e acreditar em chavões cristãos que podem prejudicar a saúde mental de jovens adultos. Essas ideias podem levar a uma visão estreita e legalista da fé, afastando as pessoas da verdadeira compreensão do amor e graça de Deus.
Além disso, a crença cega nesses chavões pode nos tornar como os fariseus, pessoas religiosas que colocam sua própria interpretação e aplicação da lei acima do amor e da compaixão pelos outros.
Portanto, devemos buscar um entendimento mais profundo e abrangente da fé, abraçando a diversidade de experiências e perspectivas enquanto mantemos um coração aberto e amoroso.
Lembre-se, Deus é amor e nos chama a amar e cuidar uns dos outros com sabedoria e compaixão.